Campeões, Dunga e Ricardo Rocha relembram conquista de 1994 que consagrou geração e retomou hegemonia no futebol
Às vésperas da Copa do Mundo de 1994 e com um jejum de 24 anos sem conquistar o título, o torcedor brasileiro não estava confiante para o torneio nos EUA. O povo vivia um luto naquele ano: o maior ídolo esportivo do país no momento, Ayrton Senna, morreu tragicamente durante uma corrida de Fórmula 1, em 1º de maio. O sonho de ganhar mais um mundial parecia distante. Entretanto, no dia 17 de julho, após um empate em 0 a 0 no tempo normal, o Brasil venceu a Itália nos pênaltis e se sagrou tetracampeão.
A seleção comandada pelo técnico Carlos Alberto Parreira disputou sete jogos, somando cinco vitórias e dois empates. Com 11 gols marcados e três sofridos, a equipe é lembrada até hoje pelos fãs de futebol. Contou com craques como Dunga, Jorginho, Branco, Ricardo Rocha e Taffarel, além da histórica dupla Romário e Bebeto. O famoso grito “É tetra!” de Galvão Bueno e a homenagem para Ayrton Senna eternizaram o quarto título mundial do país. Em entrevista ao Rampas, os ex-jogadores Dunga e Ricardo Rocha compartilham mais detalhes sobre a conquista brasileira.
Imagem com a taça eternizada
Capitão do tetra, Dunga descreve que o papel de um líder é basicamente servir e compreender a equipe, além de se fazer presente nos momentos mais delicados, que exigem bastante suporte. Para ele, um capitão deve ser um exemplo, não apenas falando, mas tomando a iniciativa e resolvendo as questões do grupo.
Ele diz que converter um pênalti em uma final de Copa do Mundo, diante de 90 mil torcedores no Estádio Rose Bowl, na Califórnia, envolveu muita responsabilidade: “Apesar de ser um esporte coletivo, naquela ocasião foi individual. É como na vida, onde as decisões mais importantes são tomadas por nós mesmos. Significa mais do que erguer um troféu. Minha foto ficará eternizada, mas, o importante foi ter sido campeão e entrado para a história, que era o objetivo comum de todos. Neste planeta, temos que fazer algo para ficarmos marcados e nós conseguimos”.
Depois de quase 30 anos da competição nos EUA, Dunga ainda mantém contato com os colegas de elenco. Ele relembra que jogava com Bebeto e Jorginho desde 1982 e que, em alguns momentos, esteve mais com eles do que com sua própria família. A preparação para o mundial começou em 1990. “Temos um grupo no WhatsApp e trocamos mensagens toda semana”, diz.
Era Dunga: de crucificado em 90 para herói em 94
O ex-volante também foi titular na Copa de 1990, disputada na Itália, onde o Brasil foi eliminado pela Argentina nas oitavas de final, por 1 a 0. Conhecida como um “fracasso”, a seleção foi criticada por apresentar um jogo pouco criativo. Dunga, em seu primeiro mundial, foi duramente cobrado. Ele conta que as críticas serviram de aprendizado para sua recuperação: “Fui crucificado, porém, isso me fez reerguer e me reinventar, porque a partir dali busquei o que eu realmente queria no futebol”.
Para Dunga, é difícil definir a seleção treinada por Parreira, mas ele destaca a personalidade, disciplina e resiliência do grupo — a superação foi um fator crucial, com todos focados no título. O ex-atleta conta que, naquele ano, o Brasil estava enfrentando dificuldades políticas e econômicas, o que aumentava a pressão sobre o futebol a cada dia. Segundo ele, a responsabilidade do time também crescia, especialmente com os sonhos de infância dos jogadores, já que ser campeão significava entrar para a história. Nada desviou o pensamento do grupo ou os distraiu do objetivo, e a Copa do Mundo era o marco que faltava para aquela geração.
Um líder fora das quatro linhas do campo
Ricardo Rocha, outro líder do elenco, se contundiu no jogo de estreia contra a Rússia, mas permaneceu com o grupo até o final da competição: “Na decisão, cheguei a ficar no banco. Até lá, fui uma pessoa de confiança para o treinador, comissão e jogadores. Eu era considerado como um líder fora de campo, que cuidava de assuntos importantes dos meus companheiros. O meu papel depois da lesão foi esse. Tinha muita confiança entre mim e eles, o que fez com que a gente permanecesse firme”.
Nas oitavas de final, o Brasil enfrentou os anfitriões, os EUA, no dia 4 de julho, data da independência estadunidense. Mesmo vencendo por 1 a 0 com gol de Bebeto, Ricardo reconhece que a partida foi perigosa, especialmente após a expulsão do lateral-esquerdo Leonardo no primeiro tempo. Outro jogo difícil foi contra a Holanda nas quartas. A equipe fez 2 a 0 e sofreu o empate, mas voltou a liderar com o gol de Branco.
De acordo com ele, a melhor lembrança do torneio foi o título, no momento em que Roberto Baggio desperdiçou o pênalti para a Itália. Ricardo relata a alegria de trazer a taça ao povo brasileiro após 24 anos: “Estávamos muito tempo sem ganhar, porque é um campeonato difícil de ser conquistado. Tem todo um passo a passo para ser campeão. Com o avanço dos jogos, a seleção foi ganhando confiança, mostrando um bom futebol, taticamente e tecnicamente. Acredito que foi emocionante para todos que acompanharam”.
A Copa de 1994 foi a primeira decidida nas penalidades. O ex-camisa 3, que assistia de fora, lembra-se de ter ficado bastante tenso. Ele comenta que, mesmo torcendo no banco, já estava nervoso, e a pressão sobre quem estava batendo os pênaltis era muito maior. Ricardo ressalta que, apesar de o time ter desperdiçado a primeira cobrança, Taffarel fez uma defesa crucial em seguida. Ele também menciona que o calor era insuportável, com aquela Copa sendo uma das mais quentes da história, o que aumentou a dificuldade. "Graças a Deus, deu tudo certo!”, comemora.
Em 2026, curiosamente, quando o Brasil completará 24 anos sem um título mundial, a Copa novamente será sediada nos EUA, junto ao Canadá e ao México. A última taça foi a do penta, conquistada em 2002, no Japão, com uma vitória por 2 a 0 contra a Alemanha.
Ricardo Rocha diz que sempre fica ansioso para os torneios mundiais. Ele está confiante com a próxima edição realizada no mesmo país do tetra: “Eu sempre irei acreditar na seleção brasileira, nunca vou torcer contra, independentemente de qualquer coisa. As pessoas misturam muito as coisas, temos que pensar no futebol e na equipe. Agora, precisamos auxiliar nossos garotos e nosso treinador. Vamos torcer para que o Brasil seja hexacampeão!”.
Sobre a Copa América, que será disputada entre 20 de junho e 14 de julho deste ano, também nos EUA, Ricardo reforça a importância de ter paciência. Ele comenta que Dorival Jr. está assumindo agora e que os três jogos amistosos foram bons. Segundo Ricardo, o futebol brasileiro tem grandes jogadores, muitos deles jovens e com qualidade. Ele cita o exemplo do garoto Endrick, que tem apenas 17 anos e se saiu bem nas partidas. Em sua visão, o Brasil tem tudo para fazer uma boa campanha.
“Senna… Aceleramos juntos, o tetra é nosso!”
A faixa levada ao gramado pelos jogadores em homenagem a Ayrton Senna é uma das cenas mais memoráveis do mundial de 1994. O piloto morreu 49 dias antes da estreia do Brasil nos EUA. Senna e a seleção tinham um objetivo em comum: ambos eram tricampeões e buscavam o tetra para o povo naquele ano. Após o acidente em Ímola, na Itália, o sonho de Ayrton não pôde ser realizado. Contudo, ainda havia esperança com Romário, Bebeto e companhia.
Ricardo Rocha afirma que a morte do piloto mexeu com muitos daquela geração. Ele lembra que era rotina acordar cedo aos domingos para assisti-lo nas corridas e que fizeram um pacto para serem campeões juntos, no futebol e na Fórmula 1: “Tivemos isso em mente porque nos marcou bastante. Disputamos um amistoso na França e foi ele quem deu o pontapé inicial”.
Dunga recorda a conversa que Senna teve com os jogadores em Paris. Ele não sabia qual dos esportes traria o tetra, mas garantiu que viria por um dos dois. “É triste porque, infelizmente, ele acabou falecendo. O Brasil campeão nessa situação mexeu com nosso emocional. Por isso, utilizamos imagens, frases e exemplos dele no dia a dia”, diz Dunga.
O que mudou de lá para cá no futebol?
Para o ex-volante Dunga, o futebol em sua essência — o drible, o gesto, a técnica — não foi modificado. No entanto, ele observa que a preparação física e a velocidade dos jogadores evoluíram significativamente, assim como a visibilidade proporcionada pelas redes sociais, que aumentaram a discussão sobre o esporte. Além disso, os próprios clubes alteraram algumas estruturas, o que, na visão dele, trouxe melhorias em alguns aspectos, mas nem todas as mudanças foram necessárias. “Acho que você não deve ‘inchar’ muito a máquina. No meio futebolístico, isso não resolve os problemas”, diz Dunga.
Ricardo Rocha concorda que a preparação física e a velocidade mudaram bastante, tornando os jogadores mais fortes e rápidos, o que ele considera importante. O ex-zagueiro também cita mudanças na medicina e na arbitragem, especialmente com o VAR. Ricardo afirma que muita coisa mudou daquela época para cá e espera que o Brasil faça uma boa Copa do Mundo em 2026, enfatizando que “temos que estar atentos a tudo, porque a mudança está na forma de jogar”.
Excelente matéria, Bia! Obrigado por me fazer saber dessa incrível história sobre a nossa amarelinha. Desejo muito sucesso para ti! ❤️
Parabéns pela matéria, é sempre bom relembrar as épocas de ouro do futebol brasileiro.
Nossa, nunca pensei que uma matéria poderia me emocionar tanto. Parabéns, Rampasuerj, parabéns, Bia, esse trabalho está incrível!!!
Parabéns!
Que Deus te abençoe. Sucesso.
Que matéria linda Ana Beatriz! Me levou as lágrimas! Como diz o ditado "recordar é viver!" E eu vivi novamente cada momento, a cada parágrafo o coração acelerando . Foi emocionante do início ao fim!
Que venham mais matérias como essa!! Digna de fazer parte da HISTÓRIA DA SELEÇÃO BRASILEIRA!!
Rampas UERJ, gratidão pela viagem linda!