Desafios da carreira artística forçam jovens a optarem pela graduação em paralelo
Por Rômulo Almeida
Você conhece a fisioterapeuta Paolla Oliveira, a publicitária Adriana Esteves ou a administradora Kelly Key? Provavelmente você já escutou esses nomes, mas talvez não saiba que por trás de suas carreiras nas telinhas ou na música existe um diploma universitário. Diversos artistas optam por uma formação acadêmica, seja antes de ingressar na carreira artística ou mesmo em paralelo a ela.
Na Uerj, muitos alunos vivem entre a arte e a sala de aula. É o caso de Caroline Alves, que se divide entre o curso de jornalismo e a ilustração. Ela descobriu essa habilidade ainda criança, mas recentemente resolveu fazer dela uma nova ferramenta de trabalho.
A história começa lá atrás, quando, em seus anos escolares, Carolline teve o primeiro contato com o lápis. O tempo passou e o seu gosto pelo desenho aumentou. Durante a pandemia, Carolline decidiu fazer um curso online e começou a trabalhar como artista de lettering, deixando seus traços em paredes de estabelecimentos ou de cômodos das casas de seus clientes. “Passei por muitos estilos, mangá, croqui de moda, realista, tatuagem, lettering e agora me aventuro na ilustração digital”, contou.
Em janeiro deste ano, Carolina participou do FCS Cria, festival organizado pelos alunos da disciplina de Produção de Eventos, do departamento de Relações Públicas da Uerj. Pela primeira vez, ministrou uma oficina. “Vejo a Uerj como um berço de oportunidades para os artistas e para aqueles que desejam desenvolver isso. Eventos como esse acontecem constantemente e são grandes chances dessas pessoas demonstrarem seus talentos e até construírem portfólio”, afirmou Caroline.
Ela foi responsável pela oficina de ilustração “A arte te chama”, pintando ecobags. Cada participante teve a oportunidade de personalizar a sua com dicas e técnicas ensinadas por Carolline.
Segundo Ana Clara Neves, uma das organizadoras do evento, a ideia era mostrar os talentos da FCS e apresentar o debate sobre a arte e sua relação com a comunicação. Os participantes eram pessoas da comunidade da FCS, entre alunos, ex-alunos e professores. Ana Clara, que cursa o 8º período de Relações Públicas, lembrou que existem muitas pessoas ligadas a algum tipo de arte na Uerj, como o desenho, a ilustração, a música e as artes cênicas. “A faculdade em si é muito criativa, a relação da UERJ com a arte é muito próxima”, afirmou. O evento contribuiu para dar protagonismo aos artistas que muitas vezes tinham seus talentos despercebidos nas salas e corredores do décimo andar.
A escolha de um diploma universitário também pode partir do interesse em buscar uma especialização dentro da atividade artística. É o que acontece com Gabriella Anelhi, de 22 anos, professora de ballet técnico na Companhia de Dança Deborah Colker. A artista concilia a dança com a vida universitária, cursando Educação Física na Uerj. Gabriella contou que, desde nova, sempre pensou em se dedicar apenas à arte, mas que a pressão social de ver todos os seus amigos entrando na faculdade fez com que ela considerasse a decisão.
Além disso, a artista passou a enxergar a faculdade como um complemento para a dança, sobretudo por fazer licenciatura. “Eu fazia aulas de dança e já dançava bem, mas queria ser uma boa professora e desenvolver esse lado de ensinar. Eu sabia que a licenciatura ia me ajudar nesse sentido, porque a gente estuda didática, pedagogia, tem todo esse lado teórico que é muito importante para o professor”, contou Gabriella.
Porém, apesar da dedicação e esforço em buscar a formação acadêmica para ter mais segurança em suas carreiras artísticas, o cenário brasileiro para esses profissionais é marcado por desvalorização, falta de incentivos e de oportunidades. Em carreiras como a dança, características físicas são um obstáculo a mais para quem quer seguir nesse caminho e não se encaixa no padrão estético desejado. "As oportunidades de trabalho são muito poucas, principalmente aqui no Brasil. E esses lugares, além de serem muito concorridos, exigem um tipo físico que eu não entro: uma bailarina magra, longilínea, alta… e eu não sou assim.”, afirmou Gabriella.
Gabriella identifica ainda algumas diferenças no mercado de trabalho das duas áreas - dança e educação física - sobretudo na baixa possibilidade de se manter somente com a arte. Por isso optou pela faculdade, em busca de segurança. E diz que, por não considerar sua área artística valorizada no Brasil, devido à falta de oportunidades de trabalho, uma de suas opções é morar em outro país.
Mesmo se considerando muito realizada na educação física, Gabriella se questiona se teria escolhido cursar uma gradução caso a dança fosse mais valorizada. “Talvez eu já teria oportunidade desde nova e agora eu não tivesse nem tempo para fazer faculdade. Agora, jovem, eu acho que se eu realmente tivesse uma boa oportunidade, eu abraçaria muito isso”, confessou a estudante. Ela acrescentou ainda que não teria tanto esse medo de não ter um emprego.
Esse cenário excludente e de poucas oportunidades é uma realidade vivida também por atores que buscam uma carreira promissora. Luisa González, atriz e estudante de Relações Públicas também na Uerj, explicou que a decisão de ingressar na faculdade partiu de sua insegurança em relação à carreira artística, pela incerteza e instabilidade da área. Ainda assim, ela também acredita que sua formação acadêmica pode abrir novas possibilidades dentro do meio artístico. “Consigo enxergar uma associação vantajosa para mim enquanto artista e comunicadora”, revelou.
“Acho que dentro da imensidão da minha área, apenas uma parte é valorizada. E essa parte é composta por uma pequena parcela de artistas já consagrados”, afirmou Luísa. Para essas estudantes, arte e graduação acabam se complementando - e elas não pretendem abdicar de nenhuma das duas.
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