Espaço na zona oeste do Rio exibe acervo da cantora e busca preservar a memória do rádio
O rádio brasileiro na década de 40 foi palco da ascensão de uma rainha cuja voz embalava milhares de fãs: Emilinha Borba. Reverenciada pelo público, a artista detinha uma coleção de sucessos que marcaram uma era. Inspirada pela história e pela trajetória de Emilinha, sua sobrinha-neta, Emanuelle Borba, fundou o Espaço Cultural A Era do Rádio, em Sepetiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Inaugurado em 31 de agosto de 2009, o espaço surgiu não apenas para reverenciar Emilinha, mas para perpetuar a cultura radiofônica e criar um acervo destacando o protagonismo da região de Sepetiba na história do veículo. Também homenageia mulheres do rádio, pioneiras que influenciaram gerações posteriores na luta pela igualdade de gênero. Emilinha Borba, claro, é a inspiradora. Roupas, discos, troféus, faixas e outras lembranças da cantora estão expostos no local.
Nascida em 31 de agosto de 1923, no Bairro da Mangueira, no Rio de Janeiro, Emilinha Borba foi uma das maiores estrelas da Rádio Nacional. Como um conto de fadas moderno, a trajetória dessa jovem, cuja mãe trabalhava como camareira de Carmen Miranda, ganhou novos rumos em 1939. Naquele ano, Carmen, ciente do potencial da jovem, decidiu levá-la ao lendário Cassino da Urca para um teste decisivo. Contudo, havia um pequeno obstáculo: a jovem ainda não tinha atingido a maioridade. Determinada a não deixar essa oportunidade escapar, Emilinha alterou sua idade e acrescentou alguns anos ao seu registro civil. Assim, a jovem artista de voz marcante tornou-se rapidamente uma das atrações principais da famosa casa de espetáculos.
Emilinha Borba compartilhou os holofotes com a renomada cantora Marlene, em uma disputa acirrada pela atenção do público. Durante a década de 1960, a artista encontrou em Sepetiba um verdadeiro refúgio e decidiu se estabelecer na região. Naquela época, Sepetiba era um bairro ainda não tão conhecido. A beleza natural e a tranquilidade do lugar encantaram Emilinha, que, ao mudar-se para lá, acabou atraindo outros artistas para a região. Sepetiba se tornou uma espécie de ponto de encontro para muitos talentos da época.
Para Manu Borba, fundadora do Espaço Cultural A Era do Rádio, a presença de um lugar voltado para a cultura em uma área esquecida é um ato de resistência. “Se essa praia fosse limpa, seria tudo diferente para os moradores e todos os bairros ao redor. O espaço cultural seria mais visado e valorizado. Por exemplo, se a Era do Rádio fosse na Zona Sul do Rio, eu já teria conseguido parcerias e patrocínio para sua manutenção". No passado, a praia de Sepetiba atraía turistas e moradores da região. Mas a degradação dos últimos anos é visível.
Neste ano, o Espaço Cultural A Era do Rádio comemora 13 anos de existência. Além de um acervo sobre a história do rádio e itens de Emilinha Borba, o centro oferece vários cursos e oficinas totalmente gratuitos para jovens e adultos, incluindo dança, teatro, fotografia e empreendedorismo. Também recebe saraus e reuniões de coletivos locais. Durante a pandemia da Covid-19 o espaço deu apoio às famílias em situação de vulnerabilidade, com doação de cestas básicas e materiais de higiene pessoal.
Emilinha Borba faria 100 anos este ano e sua trajetória impulsionou uma geração de mulheres interessadas em música e arte. Emanuelle busca honrar esse legado. A fundadora e gestora do espaço teve sua formação influenciada pela história da tia-avó e pesquisou sobre o tema desde a adolescência.
Como ativista e artista, diz que não desistirá do espaço, assim como Emilinha não desistiu de sua carreira. "Minha tia surgiu como artista em uma época de um cenário conservador, e o jeito simples que ela tinha abriu um diálogo para a igualdade de gênero, coisa que buscamos até hoje”. E lembra que um dos grandes sucessos de Emilinha foi a inesquecível marchinha Chiquita Bacana: 'Não usa vestido / Não usa calção / Inverno pra ela é pleno verão / Existencialista / Com toda razão / Só faz o que manda o seu coração'."
Em agosto de 2003, quando Emilinha Borba fez 80 anos, o jornal O Estado de S.Paulo publicou uma reportagem sobre como a artista, passada a fama, se mantinha cheia de bom humor e driblando a falta de grana. Vendia seus CDs por dez reais no Centro do Rio. Emanuelle afirma que sua tia era uma mulher gentil, forte e revolucionária, que mesmo após provar do esquecimento no meio artístico não desistiu de viver e lutar por melhores condições de vida. Emilinha Borba morreu em 2005, aos 82 anos. "Ano passado comemoramos o centenário do rádio no Brasil. É importante destacar que essa história pode e deve ser contada além dos centros urbanos. O Espaço Cultural A Era do Rádio tem como missão tornar essa memória viva e também fortalecer a arte local", diz Manu Borba.
Veja a programação de comemorações do centenário de Emilinha Borba:
Palco Cultural 100 anos de Emilinha Borba - Feira do Lavradio todos os sábados de agosto: música e exposição em homenagem a Emilinha Borba. A Feira do Lavradio ocorrerá todos os sábados do mês de agosto.
Cinemateca do MAM - RJ (Museu de Arte Moderna) nos dias 18, 19, 20, 25, 26 e 27 de agosto: Festival de Cinema "Emilinha 100 anos". É uma oportunidade de assistir a filmes relacionados à vida e à carreira de Emilinha Borba.
Festa em Conservatória - RJ: nos dias 31/08 a 31/09 ocorrerá um cortejo na praça pública de Conservatória em homenagem ao centenário de Emilinha Borba.
Exposição musical em Sepetiba: Durante os meses de agosto, setembro e outubro, haverá uma exposição musical em Sepetiba, relembrando a era do rádio e destacando a importância de Emilinha Borba nesse contexto.
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