25 anos de ‘luta pela paz’ na Comunidade da Maré
- Joziane Barbosa

- há 6 dias
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ONG já atendeu mais de 20 mil pessoas e formou atletas para seleção brasileira
Por Joziane Barbosa
A história do esporte brasileiro é contada muitas vezes por atletas que mudam sua trajetória de pobreza e dor e se tornam campeões. Adriano Imperador, atacante do Flamengo e do Inter de Milão, Bia Ferreira, campeã mundial de boxe, Romário, craque do tetra, Rafaela Silva, campeã olímpica de judô, são alguns desses nomes que, apesar de disputarem diferentes modalidades, têm algo em comum: todos foram criados em favelas e superaram as adversidades através do esporte.
Na Comunidade da Maré, no Rio de Janeiro, o esporte é visto como mais do que entretenimento para as mais de 20 mil pessoas impactadas pelo trabalho da ONG Luta Pela Paz. Se entre os becos e vielas é difícil enxergar um futuro melhor durante operações policiais que fecham as escolas durante operações policiais ou na falta de assistência do Estado, no prédio da Luta Pela Paz é possível visualizar um futuro melhor em cima de um ringue, tatame ou nas salas de aula.
Fundada nos anos 2000 pelo ex-pugilista britânico Luke Dowdney, a Luta Pela Paz começou a mudar a vida dos jovens da Maré. Os treinos aconteciam em um espaço pequeno, mas que representava a esperança de um futuro melhor para os alunos e seus familiares. O interesse foi tão grande que, três anos depois da fundação, a ONG ampliou sua grade, que antes era voltada para jovens acima dos 12 anos, e começou a atender também crianças a partir dos 6 anos.

Mas não bastava ensinar boxe. A partir de um estudo profundo, a equipe da ONG concluiu que para manter os jovens era preciso muito mais. Criou uma metodologia que foi criada com base em cinco pilares: boxe e artes marciais, liderança juvenil, educação, empregabilidade e suporte social.
Hoje, com 25 anos de atuação, o modelo criado pela ONG é replicado em mais de 25 países, e o trabalho na comunidade continua impactando diretamente a vida de crianças e jovens que aprendem, diariamente, o seu valor como indivíduo.
“Nós entendemos que o aluno precisa saber o seu valor e sua potência, por isso trabalhamos o individual. O boxe, por exemplo, é um esporte individual e que só dá certo se o atleta souber como executar cada golpe. É ele com ele mesmo. Aqui, na Luta Pela Paz, trabalhamos a autonomia de cada jovem para que ele possa estar preparado para lidar com qualquer adversidade”, destaca Caroline Belo, ex-aluna e atual gerente da ONG.
Além das aulas de boxe e artes marciais, a ONG oferece cursos de formação profissional, reforço escolar, acompanhamento com psicólogos, oficinas de cidadania e programas voltados à inserção no mercado de trabalho. Os jovens e seus familiares encontram incentivo, suporte e acolhimento para continuarem estudando e sonhando.
Formando atletas que escrevem a história do esporte do Brasil
Apesar de não ter como objetivo principal a formação de atletas de alto rendimento, o trabalho da ONG já revelou nomes que representaram e continuam representando o Brasil em competições nacionais e internacionais.
Rebeca Lima, nascida na Nova Holanda, conheceu o boxe na Luta Pela Paz quando criança. Aos 17 anos, foi a primeira atleta da categoria feminina de boxe do Brasil no Mundial Juvenil, realizado na Hungria em 2017 e, atualmente, aos 23 anos, é a dona da primeira medalha de ouro do Brasil em um Mundial de boxe. Rebeca competiu na categoria até 60kg e foi declarada campeã por decisão de 3 — 2.

Roberto Custódio, morador da comunidade, foi um dos primeiros a levar o nome da Luta Pela Paz ao pódio representando o Brasil. Em 2013, o atleta conquistou a primeira medalha de ouro do país no Pan-Americano de Boxe, no Chile, na categoria até 69 kg. Com uma trajetória marcada pela morte de seu pai, foi nas aulas e no ringue da Luta Pela Paz que Roberto encontrou o jeito de extravasar tudo o que sentia.

Wanderson de Oliveira, mais conhecido como Shuga, também é ex-aluno da ONG. Tudo começou em 2009, quando ele entrou na Luta Pela Paz para beber água e acabou se encantando com o treino que assistiu. E de lá pra cá, Shuga virou referência entre os alunos da ONG. Em 2020, integrou a equipe brasileira nas Olimpíadas de Tóquio. A medalha não veio, mas a história do boxe brasileiro já tem o nome de Wanderson de Oliveira.

Essas e outras histórias revelam a força do trabalho transformador realizado pela Luta Pela Paz. Mais do que ensinar golpes, a ONG valoriza valores, disciplina e esperança de um futuro melhor. Dentro das favelas, onde faltam oportunidades e tudo parece difícil demais, caminhos são abertos através da educação e do esporte, tornando possível a inclusão social. O trabalho da Luta Pela Paz faz torna possível que todos olhem para dentro da comunidade da Maré com mais carinho, sabendo que ali também moram jovens que sonham com um futuro melhor e eles são capazes, sim, de mudar a própria história. E a do esporte brasileiro também... Afinal, já estão mudando.
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