O sufoco de quem usa cadeira de rodas e precisa pegar ônibus no Rio de Janeiro
Qualquer pessoa que usa o serviço de ônibus na cidade do Rio de Janeiro tem algo a reclamar. Com sorte, o passageiro consegue um veículo com ar-condicionado ou com um motorista que não passa direto do ponto. Para pessoas em cadeira de rodas, os problemas são ainda maiores. Segundo um levantamento de 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 88% dos municípios do Brasil descumprem a lei de acessibilidade - segundo a qual o transporte público tem que oferecer condições de uso a pessoas com deficiência.
O autônomo Anderson Carlos, de 48 anos, usa cadeira de rodas desde 1992. Segundo ele, o desafio já começa para embarcar no ônibus.“É comum os motoristas não pararem no ponto, e eu ter que esperar o próximo ônibus. Infelizmente, é uma realidade triste, mas às vezes eles chegam a parar, os passageiros descem, e eles fecham a porta e vão embora como se a gente não estivesse ali”, afirma.
Anderson também relembra uma vez que estava no ponto com a esposa e nenhum ônibus parava. Ele conta que estava indo dar uma palestra e teve que cancelar, porque não tinha como chegar ao local. Sua esposa chegou a chorar por vê-lo naquela situação sem poder fazer nada. “Eu fiquei emocionalmente abalado por vê-la daquele jeito. Não doeu só em mim, porque eu já estava acostumado. Vê-la daquele jeito me doeu”, completa.
Mesmo que o motorista pare, o problema não acaba
Anderson conta que é muito comum que os elevadores de acesso aos ônibus estejam quebrados. Ele recorda uma situação em que teve que esperar três coletivos porque todos estavam com a plataforma quebrada. “Algumas vezes eu espero vir outro ônibus, mas quando eu estou muito atrasado, eu peço aos passageiros para me ajudarem, cada um pega de uma lado da minha cadeira, e a gente entra no coletivo assim”.
A Constituição brasileira de 1988 prevê a adaptação dos coletivos para pessoas com deficiência. Em 2004, o governo federal publicou um decreto regulamentando a lei e determinando prazo de 120 meses para que todas as cidades tivessem frotas 100% acessíveis. No entanto, terminado o período, o decreto não atingiu o resultado esperado. De acordo com o levantamento do IBGE de 2017, o Sudeste é a região do Brasil com maior percentual de municípios com a frota de ônibus adaptada - 16%.
Dentro do ônibus, a situação não é melhor
Em maio deste ano, o caso da senhora Bernadete Augusto dos Santos, de 82 anos, ganhou notoriedade. A idosa utilizava cadeira de rodas e morreu após ser arremessada para fora de um ônibus durante uma curva. No dia do acidente, Bernadete estava no espaço reservado para pessoas com deficiência dentro do ônibus da linha 209, da Viação Braso Lisboa no Rio de Janeiro. Além de não contar com um cinto de segurança bem preso, a porta do ônibus também abriu sozinha durante a curva, segundo a família da idosa.
Anderson diz que, por muitas vezes, estava dentro do ônibus e outra pessoa em cadeira de rodas não pôde entrar porque ele já estava ocupando o local reservado. Ele aponta a existência de só um espaço como um problema. “Por que entram no ônibus 30 pessoas e para o cadeirante só pode ser uma vaga? Se tiverem dois ou três cadeirantes no trajeto precisando pegar o ônibus não pode porque já tem um lá dentro. Eu já passei por essa situação”, afirma.
O que diz a lei
O Estatuto da Pessoa com Deficiência, promulgado em 2015, assegura direitos e condições de igualdade a quem tem qualquer tipo de necessidade especial. Além disso, a Lei 13.146 (Lei da Acessibilidade) reforça a obrigatoriedade para que as empresas prestadoras de serviços de transportes, sejam por trens, ônibus e metrô, tenham veículos acessíveis. A lei se refere não apenas aos veículos, mas ao conjunto do serviço, o que inclui estações, pontos de parada, ruas e rodovias.
Comentários