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O peso de envelhecer no mercado de trabalho

Entre o desemprego e a aposentadoria insuficiente, idosos enfrentam o preconceito etário e lutam por inclusão 


Por Manoela Oliveira


Foto: IStock
Foto: IStock

“Hoje, vivemos uma verdadeira guerra de idades. Na hora de avaliar o currículo, uma pessoa mais jovem pode achar que a mais velha é prepotente por ter mais experiência. Porém, alguém mais maduro pode pensar que o jovem está tentando tomar seu lugar no mercado de trabalho”. Este é o relato de Eliana Souza (50), que está em busca de um emprego há nove meses. Formada em administração, com ênfase em marketing, ela trabalhava como analista comercial antes de ser demitida, em setembro do ano passado.


Com o avanço do envelhecimento populacional, as projeções da Fundação Getulio Vargas indicam que, até 2040, pessoas com mais de 45 anos representarão a maioria da força de trabalho no Brasil. Esse novo cenário pressiona não apenas a Previdência Social, mas também os paradigmas de contratação. Com mais idosos e menos jovens contribuindo, o rombo na aposentadoria pública cresce e ameaça explodir sem reformas. O governo estima que o déficit do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) deve mais do que quadruplicar nos próximos 75 anos. A previsão consta no Projeto de Lei e Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enviado ao Congresso em 15 de abril deste ano. A expectativa é que, em 2025, a diferença entre a arrecadação e os gastos do sistema chegue a quase R$ 329 bilhões. Caso nenhuma reforma seja feita, esse déficit poderá atingir R$ 31 trilhões até 2100.


Com a queda da fecundidade e, consequentemente,  o envelhecimento populacional, a pirâmide etária brasileira vem sofrendo modificações.                                                                   Foto: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
Com a queda da fecundidade e, consequentemente,  o envelhecimento populacional, a pirâmide etária brasileira vem sofrendo modificações.   Foto: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Assim como Eliana, outros trabalhadores com mais de 50 anos enfrentam a exclusão silenciosa nas seleções profissionais. Sérgio Gentil (67), conhece esse desafio desde muito antes de se aposentar. Antes da aposentadoria, ele trabalhava como monitor de escola, mas a sua trajetória profissional começou bem antes, no setor de almoxarifado. Sérgio deixou essa função aos 42 anos e, mesmo naquela época, já sentia que a idade era um obstáculo para permanecer no mercado de trabalho. “O setor ainda pensa que o idoso vai ter problemas de saúde e o vê como uma pessoa incapaz”, afirma.



Total de  idosos no Brasil: Foto: Agência Câmara
Total de  idosos no Brasil: Foto: Agência Câmara

“Você está velho demais para isso”, “idosos não conseguem se adaptar às novas tecnologias”, “para quem tem 50 anos, você está ótimo para a sua idade”. Frases como essas caracterizam o etarismo, que consiste no preconceito baseado na idade das pessoas. Embora possa afetar pessoas em diferentes faixas etárias, essa discriminação é mais comum em idosos. Também conhecido como idadismo ou ageísmo, o etarismo pode ocorrer de forma verbal, psicológica e/ou física. No Brasil, o Estatuto da Pessoa Idosa, a Lei n.º 10.741, tem como objetivo proteger os direitos dessa parcela da população. A legislação prevê que qualquer descriminação por idade é crime, sujeita à pena de reclusão de seis meses a um ano, ou multa. 


Além dos contextos social e familiar, o etarismo também está presente no ambiente profissional. Cerca de 70% da população com 60 anos ou mais já enfrentou algum tipo de preconceito no mercado de trabalho, independentemente de suas habilidades e  experiências, conforme aponta pesquisa do Grupo Croma com base em dados da Oldiversity. O caso de Eliana ilustra um fenômeno crescente no Brasil: entre 2012 e 2022, o número de desempregados com mais de 50 anos quase triplicou, de acordo com dados da consultoria iDados. Se tantos ainda precisam trabalhar, por que o mercado insiste em fechar as portas a quem tem mais experiência? A idade, segundo a ex-analista, é um fator determinante. “Comecei a ser demitida após os 40 anos. Nessa época, passei a colocar foto no currículo, porque você tem que mostrar que está envelhecendo bem”.

Eliana está procurando emprego há oito meses,  desde que foi demitida.                                                                      Foto: Arquivo pessoal / Eliana Souza
Eliana está procurando emprego há oito meses,  desde que foi demitida.  Foto: Arquivo pessoal / Eliana Souza

Idade não é desemprego: os obstáculos de envelhecer tentando trabalhar


Em 2030, o Brasil terá mais idosos, pessoas com idade superior a 60 anos, do que crianças, segundo uma previsão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E, para a aposentada Vera Lucia Nicolau (65), além da esfera pública, é necessário o investimento das empresas em projetos de capacitação. Ela acredita que as organizações têm o papel de promover campanhas de incentivo à inclusão e apoiar a diversidade no ambiente de trabalho. 


Segundo Eliana, as empresas não estão prontas nem capacitadas para atender pessoas com mais de 50 anos no mercado de trabalho. Ela contou ao Rampas uma experiência que teve, na qual uma profissional de RH deixou claro que não leu seu currículo durante uma entrevista de emprego e chegou a perguntar como estava conseguindo se sustentar sem trabalho e aposentadoria. Isso aconteceu durante uma candidatura a uma vaga de assistente comercial com salário de R$ 2 mil, uma posição abaixo daquela que costuma buscar, mas para a qual decidiu se candidatar, por falta de outras oportunidades.


Sérgio Gentil também relatou outro desafio enfrentado por pessoas idosas: a dificuldade financeira após a aposentadoria. “Você se aposenta, e o dinheiro cai. O salário do aposentado diminui muito”. Hoje, ele consegue se manter com a ajuda da família e não precisa de uma renda extra. No entanto, Sérgio afirma que, se não fosse por esse apoio, precisaria encontrar um trabalho aos 67 anos. Cerca de 70% dos idosos acreditam que a aposentadoria não é suficiente para viver. É o que mostra um levantamento da Serasa, empresa que atua na área de análise de crédito. 


Número de aposentados e pensionistas no Brasil. Foto: IBGE
Número de aposentados e pensionistas no Brasil. Foto: IBGE

Moradora de Jaboatão dos Guararapes, município de Pernambuco, Eliana enfrenta dificuldades para acessar programas de assistência social. Desde abril, quando fez a inscrição, ela está aguardando a visita dos assistentes do Bolsa Família, mas até o momento não obteve retorno. Desempregada, diante da falta de respostas, muitas vezes ela precisa se deslocar até a capital, Recife, para ir até a Agência do Trabalhador, que fica próxima. Porém, isso se torna um desafio pelo custo da passagem, devido à sua situação financeira. “A população está sendo ensinada a sofrer. Você só consegue algum recurso quando está passando por um sofrimento grandioso. É como se fosse preciso estar em estado de miséria para ter acesso a algum tipo de ajuda”.


Recomeçando aos 50 anos


A Prefeitura do Rio lançou o Programa Empregabilidade, que oferece vagas exclusivas para pessoas com 50 anos ou mais. Coordenada pela Secretaria do Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida (Sesqv), a iniciativa tem como objetivo promover a inclusão desse público no mercado de trabalho e valorizar a experiência profissional acumulada. 

O programa oferece oportunidades para as funções de auxiliar de serviços gerais, repositor, auxiliar de cozinha, estoquista, atendente de padaria e fiscal de loja. Os contratados terão salário a partir de R$ 1.512, além de benefícios como vale-transporte e alimentação no local. Segundo a secretaria, até o momento, 1.696 pessoas foram cadastradas no programa e, para garantir que cada candidato seja direcionado à vaga que melhor se encaixa em suas habilidades e experiência, a equipe responsável realiza um cruzamento detalhado das informações fornecidas no cadastro, além de entrevistas individuais. “É sobre acompanhar as pessoas de perto, não se trata somente de encaminhar ao mercado de trabalho”.


O cadastro deve ser feito na sede da Prefeitura, na Rua Afonso Cavalcanti, 455, sala 1017, de segunda a sexta-feira, das 10h às 15h, ou nas oito casas de convivência da Sesqv.


Mapa das casas de convivência para idosos na cidade do Rio de Janeiro


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