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Foto do escritorLaura Machado

Passistas de favelas do Rio conquistam espaço no concurso da Corte Real do Carnaval

Agremiações indicam e apoiam financeiramente moradores da comunidade para a disputa


Salgueiro, Acadêmicos da Rocinha e Imperatriz Leopoldinense, três escolas de samba tradicionais do Rio de Janeiro, têm em comum algo mais que a folia. As três têm prefiro levar passistas crias da comunidade como suas representantes no concurso da Corte Real do Carnaval do Rio de Janeiro.  Em 2025, serão eleitas sete integrantes na Corte do Carnaval, incluindo musos LGBTQIAPN+ e um Cidadão Não Binário.


A nomeação da Rainha, do Rei Momo, 1° e 2° princesas, além dos musos e Cidadão Não Binário, acontece na véspera do Carnaval carioca. O Rei Momo é o personagem da alegria, entusiasmo e diversão do carnaval. Ele é o "rei" do carnaval, no sentido de ser a principal figura de comando da festa.Já a Rainha do Carnaval é uma figura feminina que representa a beleza, a graça e a sofisticação da festa. 


Antes da pandemia, o Concurso era algo distante para a maioria das passistas, pois o custo para participar de forma independente era muito alto. Era preciso investir muito dinheiro para criar o vestido de gala e a fantasia de show, que são usados pelas finalistas. No entanto, a partir de 2023, com a exigência da RioTur de que cada escola de samba indicasse suas participantes, o concurso se tornou uma realidade para muitas passistas, que passaram a contar com o apoio financeiro de suas escolas em todas as etapas do evento.


Ela é eleita para ser uma espécie de "musa" da festa, encantando o público com sua presença e elegância, e geralmente tem uma conexão forte com a cultura e tradição das escolas.


Além do simbolismo, a Corte Real tem um papel de liderança dentro da comunidade carnavalesca. Eles participam de eventos, desfiles e festas, ajudando a promover o carnaval para o público e mantendo a animação de todos. 


Maryanne Hipolito é a candidata indicada pelo GRES Salgueiro para disputar a coroa maior. Ela, que dos 26 anos de vida, dedica 21 à arte do samba, Maryanne já passou por diversas agremiações, como no Salgueiro, onde é passista há mais de 10 anos e na Acadêmicos do Cubango, onde já foi Rainha de Bateria, além de já ter sido integrante da Corte Real do Carnaval de Niteroi. 


Mary  é cria da comunidade Sítio de Ferro, em Niterói, também é cirurgiã dentista. Diz que o samba levou disciplina à sua vida pessoal e profissional: “O Carnaval me trouxe doutrina. Aprendi e aprendo todos os dias com o Carnaval. Ele transformou a minha vida e pode transformar a vida de todos vocês também, basta acreditar”, finalizou, emocionada.


Mary conta um pouco sobre como é importante ter pessoas que são passistas e musas concorrendo ao Concurso que, por muitos anos, se manteve afastado daquelas que possuem a arte do samba no pé nas veias.


“É uma honra estar participando deste concurso sendo apoiada por uma escola tão grande quanto o Acadêmicos de Salgueiro. Quando eu entrei no Salgueiro como passista, eu entrei por ser fã do Salgueiro por amar,por admirar a ala. Hoje eu estou aqui representando tudo isso que um dia eu tanto admirei. Então é muito importante, é a realização de um sonho. Estou muito feliz, sendo completamente apoiada pela escola. Pelo presidente André Vaz, pelo nosso patrono. É difícil contar a emoção!”


Para a passista, é fundamental que haja representatividade dentro da festa mais diversa do Brasil, que é o Carnaval. Bissexual assumida, Mary fala da importância de se ver como pessoa que pode ser inspiração para a nova geração do samba.


“Eu faço parte da comunidade LGBT, e é importante para mim ter essa representatividade, esse espaço. O Carnaval por muitos anos foi palco para pessoas que nem viviam de samba, ganhar visibilidade. Hoje, com as passistas podendo mostrar a sua arte, o amor, a entrega de quem vive todos os dias essa atmosfera, é de extrema importância esse espaço existir e aumentar cada vez mais”, finaliza.

Júnior Almeida e Fernando Henrique, dois jovens apaixonados pelo Carnaval, acompanharam a semifinal e reforçaram  a importância de incluir pessoas LGBTQIAPN+ no cortejo real:


"É mostrar que o Carnaval está em outro patamar, que ele acompanha as diversas mudanças sociais e que é uma vitrine para o mundo todo. Nos dias de Avenida, a gente pode ser quem a gente é, sem preconceitos. É um grito contra o preconceito, contra a opressão e o canto pela liberdade. Precisamos mostrar o Carnaval como a vitrine identitária da liberdade e do grito das minorias populares."


Passista Maryanne Hipólito na semifinal do Concurso da Corte Real do Carnaval. Foto: Acervo Pessoal - (@hipolitomary1)

A Corte estará presente em várias atividades, como os desfiles das escolas de samba, ensaios de rua, além de eventos da Prefeitura do Rio, como o recebimento da chave da Cidade das mãos do prefeito.


A favela mais populosa do Brasil também foi representada por uma de suas crias. Alessandra Martins, mais conhecida por Lelê, tem  23 anos, é nascida na favela da Rocinha e representou a GRES Acadêmicos da Rocinha no concurso. Seu amor pelo carnaval começou ainda criança, quando era integrante da Escola Mirim Borboleta Encantada, também situada na Rocinha.


Ela conta sobre a  importância dos projetos sociais e como foi a sensação de ser escolhida para representar sua comunidade pela primeira vez no concurso. 


“Desde o primeiro momento foi uma responsabilidade muito grande, mas ao mesmo tempo foi uma missão que eu fiz com muito carinho e muito amor. Ser representante da maior favela do Brasil é também ter a responsabilidade de despertar sonhos. Eu fiz parte de projetos sociais, então eu sei que além de nos oferecer prazer, desenvolve a autoestima desde criança, eles ampliam nossos horizontes, eles nos oferecem profissionalização e com o concurso eu consegui devolver um pouco do que eu aprendi na minha comunidade e eu acho que isso vai além de qualquer prêmio.”


Passista Lelê Martins na semifinal do concurso da Corte Real do Carnaval. Foto: Acervo Pessoal - (@lele_martiinsrj)

E por falar em projetos sociais, Lelê é uma das instrutoras do projeto Sambavista, que promove aulas de samba gratuitas para crianças e adultos, duas vezes por semana, em dois pontos da favela da Rocinha. Nas segundas, as aulas acontecem na Praça do PAC e nas quintas, na Quadra da Roupa Suja. 


Ingrid Castro, de 24 anos, universitária, cria do Complexo do Alemão e passista da Imperatriz Leopoldinense há 2 anos. Com muita evolução, garra e determinação, ela chega à semifinal com o apoio dos gresilienses, em especial a presidente, Cátia Drumond. Ela conta um pouco sobre os desafios da final e de sua superação, fator que foi muito comentado entre os participantes do Concurso.


A passista compartilhou que viver a experiência do concurso para a coroa maior foi extremamente desafiador, mas ressaltou que todo desafio traz a oportunidade de evolução e crescimento.


“Eu olhei para esse concurso e vi ali a oportunidade de evoluir no meu samba no pé, nas minhas questões pessoais, de ir à luta pelo que eu sonho, pelo que eu acredito na minha vida.”


Passista Ingrid Castro na semifinal do concurso da Corte Real do Carnaval. Foto: Divulgação - (@alosetor1)

Embora tenha participado de forma independente, ela destaca o apoio e carinho constantes de sua escola, GRES Imperatriz Leopoldinense, que sempre esteve ao seu lado, respeitando a candidata oficial. A passista também expressou sua gratidão pela grandiosidade do concurso, que lhe proporcionou momentos enriquecedores, como a oportunidade de ser ensaiada pela rainha de bateria Mayara Lima e o diretor de passistas Alex Coutinho, ambos do GRES Paraíso do Tuiuti e de conhecer figuras como Bianca e Wilson, que foram os apresentadores do Concurso esse ano. Para ela, essa experiência foi um marco importante no início de sua trajetória.


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