Quando envelhecer é uma arte
- Rampas

- 26 de nov.
- 4 min de leitura
Espaços para terceira idade apostam em atividades artísticas para combater a solidão e fortalecer saúde mental
Por Emillyn Silveira e Lívia Maria Oliveira
Quem passa pelo Shopping Cidade Copacabana, na Zona Sul do Rio de Janeiro, numa tarde de sexta-feira, escuta uma melodia incomum em meio ao barulho do bairro: notas de um piano. No segundo andar, ao lado das escadas rolantes, um grupo de pessoas idosas assiste à apresentação do pianista Luiz Antonio Bevilaqua, de 60 anos. Aquele encontro é um ritual semanal para aquelas pessoas.

A iniciativa Tardes ao Piano surgiu em 2018 com o objetivo de atrair lojistas, condôminos e frequentadores para o shopping, mas se tornou ponto de encontro para moradores da região, em sua maioria pessoas idosas. O foco inicial não era o público da terceira idade, mas, segundo Bevilaqua, aconteceu. “Aconteceu porque Copacabana, em geral, é o lar dos idosos. Então eles vêm muito para cá. E quando viram e descobriram que tinha música ao vivo, eles vieram e passou a lotar aqui, muitas vezes”, explica Bevilaqua.
Júlia Maria Marques, de 67 anos, não perde uma apresentação. “Deus me livre! Se a gente não vier, a gente fica doente”, brinca. Ela conta que começou a frequentar o evento após ouvir uma pessoa comentar sobre a apresentação enquanto estava no supermercado, no primeiro andar do local. “Nós subimos, ouvimos o piano e ficamos. E estamos até hoje. Já tem quase um ano”, disse. Ela destaca que o momento serve para conversar e se divertir, além de ser bom para a memória.

Toda quinta e sexta-feira, durante duas horas, de 15h às 17h, o pianista relembra os clássicos da música nacional e internacional para uma plateia com cerca de 25 pessoas por dia. Bevilaqua comenta que o repertório foi construído junto do público. “Algumas eu escolho e jogo para ver qual é a reação. Porque, em geral, eu toco coisas da rádio, das telenovelas. Algumas pessoas reconhecem e pedem para tocar de novo e eu vou fazendo”, explica. Entre as mais pedidas, segundo ele, estão My Way, de Frank Sinatra, Em Algum Lugar do Passado, de John Barry, e As Rosas Não Falam, de Cartola.
Valencia Renata Pedro, de 63 anos, é outra espectadora assídua. “Participo sempre, toda quinta e sexta”, afirma. O contato social e a interação com as pessoas é sua maior motivação para estar presente. “É uma verdadeira terapia. Você faz muitos amigos e escuta música de qualidade com um pianista maravilhoso”, comenta. Para ela, a música representa uma lembrança de sua infância. “Me lembra dos momentos bons da minha vida, me transporta para outros lugares, para outras pessoas que estão distantes fisicamente, mas estão sempre comigo no pensamento”, confessa.

Os acordes iniciais de Tema da Vitória, composta por Eduardo Souto Neto com arranjo do grupo Roupa Nova, anunciam ao público que mais uma tarde está chegando ao fim. Com a mesma promessa, os espectadores se despedem: até a próxima.
Enquanto isso, fora da região metropolitana do Rio, na Baixada Fluminense, um antigo bar deu espaço ao Centro de Convivência da Melhor Idade, administrado pela Subsecretaria da Melhor Idade de São João de Meriti. Inaugurado em 2023, o local atende entre 300 a 400 pessoas idosas diariamente, chegando a 9.000 cadastrados no sistema. Num estado onde 13,1% da população é composta por pessoas idosas, o Centro de Convivência é um dos locais que, além de cuidar da saúde física, promove bem-estar e qualidade de vida.

O espaço oferece diversas oficinas e práticas de bem-estar, como artesanato, dança de salão, alongamento, hidroginástica e recreação na piscina para pessoas idosas a partir de 60 anos. As oficinas acontecem de segunda a sexta, das 8h às 17h, e têm o objetivo de promover bem-estar físico, social e emocional, além de estimular a criatividade, o movimento e a socialização entre os participantes.
O Centro reúne muitas histórias de superação, perseverança e paixão pela vida. A professora de artesanato Selma Ramalho começou a ensinar técnicas artísticas no local há cerca de 9 meses. Sua arte consiste em reciclar tudo o que iria para o lixo e transformá-lo em objetos bonitos e úteis para o dia a dia, como suporte para controle remoto feito de caixa de sabão em pó e agulheiro feito de pote de requeijão.
A professora destaca o quanto sua aula ajuda a mente das pessoas idosas, evitando que elas fiquem “em casa à toa e com depressão”. Foram matriculados 35 alunos em suas aulas, mas apenas 10 frequentam. Ela explica que o número diminui porque muitas pessoas idosas têm mobilidade limitada.
Moradora de Maricá, Selma já está de pé às 3h da manhã para pegar a condução às 4h. “O dia ainda está amanhecendo e eu já estou na rua”, explica. Ela comenta que tudo o que faz é por amor à profissão e às alunas.

Além das atividades, o Centro é um bom lugar para fazer novos amigos, como afirma Célia Machado, de 79 anos. “Falamos com todo mundo, rimos com todo mundo. Se alguém sofre, nós também sofremos”, comenta. Célia, que faz massoterapia e acupuntura, também destaca o carinho dos profissionais. Quando começou o tratamento, não conseguia mexer o braço por um deslocamento, devido a uma queda, e agora já realiza as atividades de casa.
Maria Silvério, de 73 anos, conta que, após iniciar as aulas de Tai Chi Chuan e dança de salão, percebeu melhorias significativas em sua saúde e disposição. Com brilho nos olhos, ela fala com entusiasmo sobre as amizades que fez.
Localizado no bairro Jardim Meriti, na rua Joana Kalil s/nº, o Centro oferece atendimento gratuito de saúde com profissionais de fisioterapia, clínico geral, cardiologia, psicologia, massoterapia e acupuntura. Esses serviços são realizados por profissionais qualificados e estão disponíveis para os idosos cadastrados no sistema, conforme a agenda e a necessidade individual. Para utilizar todos os serviços disponíveis, assim como as oficinas e atividades, basta levar identidade, CPF, comprovante de residência, cartão do SUS e duas fotos 3x4 para receber a carteira de acesso.
Para mais informações, clique aqui e acesse o Instagram do Centro de Convivência da Melhor Idade.
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