top of page

Rocinha é bairro do Rio mais vulnerável a deslizamentos, aponta projeto

Iniciativa Rio 60°C, do portal Ambiental Media, mapeia a cidade e mostra que regiões periféricas estão mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima


Por Everton Victor


Comunidade da Rocinha, Zona Sul do Rio de Janeiro     Fernando Frazão/Agência Brasil
Comunidade da Rocinha, Zona Sul do Rio de Janeiro Fernando Frazão/Agência Brasil

Chuvas fortes com resultados extremos, como deslizamentos e inundações, estão cada vez mais frequentes. Recordes de temperaturas também são cada vez mais frequentes. Os efeitos da mudança do clima já são realidade, e, a depender da região da cidade do Rio de Janeiro em que você se encontra, o impacto é sentido de forma diferente. É o que apontou o projeto “Rio 60 °C”, um mapeamento digital realizado pela organização jornalística Ambiental Media em parceria com o RioNowcast+Green, da Universidade Federal Fluminense (UFF).


A Rocinha, na Zona Sul do Rio, é a maior favela do Brasil, com 72.021 moradores e 30.371 casas, de acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estática (IBGE). Desses, 11 mil domicílios estão em áreas de alta vulnerabilidade para deslizamentos e 1,4 mil classificados com um risco muito alto, segundo o Rio 60 °C. Ainda de acordo com o projeto, o bairro concentra o maior número de  casas em risco de deslizamento da capital fluminense. O projeto Rio 60°C foi uma das iniciativas de jornalismo apresentadas no Festival 3i, realizado no Rio de Janeiro entre os dias 6 e 8 de junho na ESPM, com foco na exposição de projetos de jornalismo independente e inovadores.


No complexo de favelas Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, também na Zona Sul do Rio, 3 mil moradias estão localizadas em áreas de alta vulnerabilidade a deslizamentos, enquanto 899 estão em área classificada como de muito alta vulnerabilidade. A exposição dos cariocas a riscos de deslizamentos não está restrita às comunidades da Zona Sul da cidade. Na Mangueira, Zona Norte do Rio, são 1,6 mil residências em alta vulnerabilidade e 765 em muito alta. Em Realengo, bairro da Zona Oeste, 517 moradias estão sujeitas a este risco e 12 classificadas em muito alta.


Bairros da cidade com mais domicílios vulneráveis a deslizamentos, de acordo com o projeto Rio °60 C        Foto: Julia Lima
Bairros da cidade com mais domicílios vulneráveis a deslizamentos, de acordo com o projeto Rio °60 C   Foto: Julia Lima

Condy Menezes, morador da Rocinha, na Zona Sul do Rio, há 48 anos e ativista social há mais de 20, é integrante da Associação de Moradores do bairro. Ao Rampas, ele contou a realidade de quem sofre com os eventos climáticos na comunidade. “Os moradores, depois dos dias de chuva, nos procuram para solicitar vistorias, principalmente da Defesa Civil, para avaliar riscos de desabamentos, deslizamentos de encostas e até para retirada de barro e terra que tenha adentrado casas”, explica.


Jornalista Thiago Medaglia em entrevista ao RAMPAS durante o festival 3i    Foto: Julia Lima
Jornalista Thiago Medaglia em entrevista ao RAMPAS durante o festival 3i Foto: Julia Lima

Para o jornalista Thiago Medaglia, diretor-executivo da Ambiental Media, a análise de dados presente no projeto Rio 60 °C permite entender os desafios para enfrentar a mudança climática. Segundo ele, os eventos climáticos extremos são manifestações locais do aquecimento global que atingem todos, no entanto, impactam de maneira mais drástica populações socioeconomicamente vulneráveis. “Na iminência de um evento extremo, essas pessoas vão para onde?”, indaga.


De acordo com a pesquisa, a cidade do Rio de Janeiro concentra 70 mil domicílios em áreas de alta vulnerabilidade e 10 mil com risco muito alto de deslizamentos. Para inundações, os dados são ainda maiores: 530 mil casas estão suscetíveis e 132 mil estão categorizadas com risco muito alto. O projeto “Rio 60 °C” destaca como a urbanização desregulada em alguns bairros próximos aos três maciços da cidade – Tijuca, Pedra Branca e Gericinó-Mendanha, tornam essas casas mais expostas a perigos. A Rocinha, por exemplo, fica localizada na vertente sul do Maciço da Tijuca.


A urbanização desordenada acontece quando o crescimento de uma cidade não segue um planejamento - por exemplo, uma casa construída em uma  área de proteção ambiental ou em uma região por onde passa um rio. São domicílios erguidos sem que se tenha uma análise prévia sobre a viabilidade e a segurança de ter uma moradia naquele local. 

 

Este processo é acompanhado por políticas, ou a falta delas, no amparo ao cidadão. Muitas vezes, mesmo sem se sentir seguro na região em que reside, ele prefere permanecer numa área de risco, por não ter outra opção. “Quem mora em área de risco nunca se sente seguro, eles sabem que de alguma forma estão em risco iminente de que algo possa acontecer. Quanto maior a intensidade da chuva, maior o medo”, afirma Condy.


Apesar da insegurança constante e do estado de alerta em que essas pessoas se encontram, a Associação de Moradores faz um suporte direto aos moradores na Rocinha. Através da orientação de pontos de apoio, mobilização comunitária para repor perdas e até ajuda psicológica. São tentativas de mitigar danos a moradores que por vezes já estão em situação de vulnerabilidade, segundo Condy. Perguntado se se sente amparado pelo poder público em sua comunidade, ele respondeu  que, sempre que acionadas, a subprefeitura, a Defesa Civil e a Comlurb se fazem presentes. 


Em nota ao Rampas, a Fundação Geo-Rio, órgão vinculado à Secretaria Municipal de Infraestrutura, afirmou ter concluído 13 obras de contenção de encostas na Rocinha desde 2021, com um investimento de R$ 12,7 milhões. “As intervenções foram fundamentais para aumentar a segurança da população que vive em áreas com risco geológico, especialmente durante o período de chuvas”. Entre os serviços citados pela Geo-Rio estão a construção de cortinas atirantadas (sistema de contenção de encostas), muros de contenção em concreto armado, solo grampeado, instalação de canaletas de drenagem e de telas de aços.


Walmir Júnior, mestre em Sustentabilidade pela PUC-Rio e coordenador da horta popular “Maria Angu”, é morador da comunidade de Kelson, na Penha, Zona Norte do Rio. Para ele, existe uma dificuldade do poder público proteger esses cidadãos que vivem em áreas de risco. “Quando a gente tá falando de alagamento, inundação, estamos falando de casas que tão sendo perdidas, de vidas que estão sendo tiradas. O Estado é detentor desse cuidado da vida da população”, reforça.


Apesar dos efeitos das mudanças climáticas se concentrarem nas consequências nas cidades - como altas temperaturas, secas extremas, poluição do ar, o impacto também pode ser fatal para a saúde humana. No ano de 2024, o Brasil registrou 306 mortes em decorrência de eventos climáticos, segundo levantamento do Atlas Digital de Desastres do Brasil. Ainda de acordo com este levantamento, 299 mil brasileiros ficaram feridos ou adoeceram em decorrência de desastres climáticos no ano de 2024. 


Para Walmir Júnior, é preciso enfrentar as mudanças climáticas com a inclusão da justiça climática nessas ações. O termo citado por Walmir  já é praticado nos debates sobre a responsabilidade de cada nação para reverter o aquecimento global. Ele defende pautar esta justiça climática também nos territórios, através de políticas públicas voltadas para quem está mais suscetível a sentir os impactos das mudanças climáticas.


O racismo ambiental, mecanismo também agravado com a emergência climática, através de desigualdades raciais que  se manifestam nos eventos climáticos, também é um ponto de discussão por Walmir. Ele participou de uma apresentação sobre a iniciativa Rio 60°C durante o Festival 3i.Confira um trecho da apresentação.



O projeto Rio 60 °C analisa indicadores socioeconômicos, como renda, taxa de analfabetismo e quantidade de moradores por domicílio, a estrutura urbanística da capital fluminense e dados sobre o tema. “A ideia é utilizar esse material como fonte de informação para educação ambiental”, explica Thiago Medaglia. 


Apresentação de próximo passos e a continuidade do Rio 60 °C Fonte: Julia Lima
Apresentação de próximo passos e a continuidade do Rio 60 °C Fonte: Julia Lima

No site, é possível visualizar a cidade do Rio através de mapas interativos que indicam regiões mais suscetíveis a deslizamentos e inundações. Ao Rampas, Medaglia contou que o número “60°C”, que faz parte do nome do projeto, inicialmente não era esse, mas com a sequência de temperaturas recordes que ultrapassaram sensações térmicas de 40°C, 50 °C, e, mais recentemente 60 °C, atualizou a numeração do projeto.


A cidade registrou o recorde de 62,3°C no dia 17 de março de 2023. É a maior sensação térmica registrada desde 2014, quando o Sistema Alerta Rio começou a fazer a medição.  


  • Mecanismo de monitoramento de chuvas


No site da Defesa Civil do Rio de Janeiro há um manual explicativo sobre deslizamento e alguns sinais que podem identificar se o domicílio oferece algum risco. A prefeitura do Rio disponibiliza em seu site Alerta Rio o monitoramento em tempo real sobre a quantidade de chuva nos bairros da cidade.


O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) realiza diariamente a divulgação de boletins diários sobre áreas que estão passando por algum risco geo-hidrológico no momento. Junto ao Painel de Alerta, também do Cemaden, que categoriza em número o nível de alerta por estado.


Se você mora em um desses municípios - Angra dos Reis/RJ,  Blumenau/SC; Cachoeiro de Itapemirim/ES; Gaspar/SC; Indianópolis/MG; Morretes/PR; Muçum/RS; Petrópolis/RJ;  Roca Sales/RS; São Sebastião/SP;  União da Vitória/PR -, a Anatel notifica por mensagem de texto quando há locais de risco com iminente de desastres sem precisar ter um cadastro prévio na plataforma. A escolha de cidades a ofertar o serviço foi realizada a partir do volume de alertas emitidos em 2023 pela Defesa Civil e desastres recentes de grande impacto.


SERVIÇO


199 - Número da Defesa Civil.

193 - Corpo de Bombeiros.

192 - Ambulância


Em casos de emergência, como solicitação de vistoria,  acione esses órgãos.




Comentários


O site Rampas é um projeto criado por alunos de jornalismo da Uerj, sob supervisão da professora Fernanda da Escóssia.

©2025 por Rampas.

bottom of page