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Foto do escritorSabrina Jacob

Salvando o planeta com muito estilo

Atualizado: 5 de jul.

Oficina de moda sustentável ensina jovens do Vidigal a customizar roupas, combater fast-fashion e sonhar com futuro profissional


Numa casinha de paredes coloridas na favela do Vidigal, Zona Sul no Rio de Janeiro, um projeto mistura educação, sustentabilidade e moda para mostrar que é possível ajudar a salvar o planeta em grande estilo. Sob o comando da artista plástica Thaís Dutra, os alunos aprendem a usar papel, plástico e o que estiver à mão para transformar peças ordinárias em itens super desejados.


Entre tintas, lantejoulas, tecidos e pincéis, até um gibi da Turma da Mônica se tornou instrumento de trabalho. A jaqueta estampada com os quadrinhos de Maurício de Sousa é uma peça muito querida tanto pela turma quanto pela professora e é exibida com orgulho aos visitantes. A classe também criou uma carteira feita só de sacolas plásticas usadas.


A oficina faz parte do Bonsai, um espaço destinado a cursos profissionalizantes e oficinas, associado ao projeto social Cidades Invisíveis, onde são vendidos diversos produtos, como camisas e cangas. Todo o lucro das vendas e doações é destinado às iniciativas do Cidades Invisíveis. O Bonsai possui quatro unidades no Brasil, sendo duas em Florianópolis (SC), uma em São Paulo (SP) e outra no Vidigal.


Nascida e criada no Vidigal, Thaís, de 25 anos, iniciou sua paixão pela moda voltada à sustentabilidade muito cedo. Queria se vestir de um jeito diferente, mas não tinha como comprar roupas novas. “Assim como na realidade de muitas meninas e mulheres na favela, eu não tinha dinheiro para comprar, ficar trocando roupa. Eu queria ter uma coisa nova e não podia ter”.


Nisso surgiu a ideia de transformar os seus jeans rasgados e blusas encardidas em itens novos e únicos a partir das técnicas de customização. “Eu pensava: tem essa calça que está rasgada, vou rasgar mais um pouquinho. Aí já virou uma coisa diferente! Uma blusa que está manchada, mas que não vou deixar de usar por estar feia… vou customizar”, relembra.


A jovem também se inspira em sua própria vivência para construir sua arte. Com apoio da avó costureira, fez o curso de corte e costura no SENAC. Aos 9 anos entrou no grupo de teatro Nós do Morro e se apaixonou pela área de figurino. O grupo é uma tradição do Vidigal, e de lá saíram artistas como Babu Santana e Micael Borges, além de boa parte do elenco do filme Cidade de Deus. 


Nas aulas do Bonsai, voltadas para jovens de 11 a 17 anos, Thaís ensina técnicas de customização, como métodos de upcycling, que consiste na renovação de roupas; tie-dye, o tingimento de peças; além de pintura, desenho, bordado e aplicações. A turma conta atualmente com oito alunos, mas já teve um total de 16 jovens.


A ideia é criar uma produção de roupa mais ecologicamente correta, conectada com um futuro melhor para as próximas gerações. E mostrar que salvar o planeta Terra sendo estiloso é para qualquer um. 


“É você ser livre para deixar a sua criatividade te guiar. Então qualquer pessoa pode fazer. Se todo mundo fizesse, o lixo têxtil não ia durar, não ia ser do jeito que é hoje. A moda gera um dos piores lixões do mundo, que mais prejudica o planeta”, explica Thaís.



Customização elimina barreiras financeiras para se vestir bem


Lara Freire, de 12 anos, está há um ano na oficina e conta com enorme animação o que mais gosta de fazer nas aulas: inovar. A aluna do sétimo ano costuma utilizar materiais recicláveis para criar novas peças, e seu trabalho favorito até agora foi a jaqueta feita a partir de gibis antigos da turma da Mônica. “Foi uma ideia legal no começo, mas depois foi estressante. A tia sabe como foi! Porém, no final, a gente teve uma recompensa, porque ficou muito bonito”, diz.


A “tia” Thaís explica com humor por que a jaqueta de gibis foi cansativa. “Nenhuma cola colava os gibis. Foi um desafio até pra mim porque eu não sabia exatamente como colar papel numa jaqueta jeans. Foi um trabalho de pesquisa em conjunto. Todo dia eu vinha, trazia alguma coisa diferente pra gente tentar deixar a jaqueta melhor, mais bonita, e deu certo no final.”


Dafine Isabela, 12 anos, está há dois anos aprendendo moda sustentável com Thaís e também gosta muito da jaqueta da Turma da Mônica. Mas sua favorita é uma jaqueta preta pintada na técnica de tie-dye, em um trabalho conjunto dos alunos com a professora. “Para mim, lembra o universo”, resume.


A partir das aulas, Lara e Dafine levaram os ensinamentos para o seu dia a dia e começaram a customizar itens das quais não gostavam tanto. A influência da professora na vida das meninas foi tamanha que Lara pensa em seguir o ramo fashion em breve. “Eu vi que a Thaís trabalhou com isso, ela contou a história dela, que trabalhou no carnaval desse ano, e eu quero fazer isso também.”


Quando pensa no que quer ser quando crescer, Dafine fala do sonho de trabalhar na área. “Eu gosto muito do mundo da moda e, se eu conseguir uma oportunidade, eu adoraria trabalhar com isso.”


Impacto da oficina vai além do se vestir diferente


Nas aulas, Thaís repassa à turma seus conhecimentos sobre o mundo do brechós e a importância de entender o mercado fashion. “Coloquei as meninas para aprender um pouco também desse meio, como é etiquetar roupa, vender, o que ver depois que vende.”


A artista foi criadora do brechó Princesa da Favela, que funcionou de 2020 a 2022 vendendo peças semi novas e personalizadas, além de acessórios confeccionados pela própria. Mas, antes desse empreendimento, ela já trabalhava em brechós com a mãe desde os 15 anos. 


Rúbia Alves, de 16 anos, é uma das alunas que segue os passos de Thaís. Ela precisou sair do projeto por não conseguir conciliar as atividades do Bonsai com o trabalho, porém os ensinamentos da artista plástica se mantiveram vivos e Rúbia é atualmente dona de um brechó.  “Eu vejo que eu me tornei uma referência. Então, é muito gratificante pra mim que todas elas possam sair da oficina, com o pensamento de empreender, seja na moda, seja em outra coisa”, comemora Thaís.



Um laboratório de criatividade fashion


O processo de criação das peças começa com um debate. Os alunos contam suas vivências, buscam referências na internet e definem o que podem fazer com cada peça. Às vezes, desenham croquis. Assim foram surgindo vestidos, calças, chapéus,  carteira, bolsas, ecobag e diversas blusas, sempre numa criação coletiva entre estudantes e a professora. Um dos orgulhos do grupo foi um bucket hat, aquele chapeuzinho mole e com aba, também chamado de chapéu de pescador. O item original era desgastado, sujo e mofado e surgiu como produto final uma peça colorida e cheio de brilhos.



Sobre o Bonsai Vidigal e suas oficinas 


O Bonsai Vidigal está localizado na rua Major Toja Martinez Filho, 138. É possível chegar de mototáxi ou caminhando 18 minutos desde a praça do Vidigal. A unidade oferece aulas de boxe, reforço escolar, papo com a psicóloga do programa, ioga, dança e customização de roupas. Todas as aulas são gratuitas e voltadas para alunos de até 17 anos, moradores do Vidigal ou não.


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