As compensações e reclamações de quem é convocado pela Justiça Eleitoral para trabalhar nos dias de votação; universitários podem ganhar horas complementares
Por cartas, e-mails, mensagens de texto e até uma mensagem de WhatsApp para o celular de sua mãe, a estudante de Jornalismo da Uerj Larissa Moura, 22, recebeu a notícia de que, no dia 6 de outubro, deveria comparecer à sua seção eleitoral não apenas para votar. Larissa foi convocada para atuar como mesária. “Não tive saída”, disse a estudante, que ficou chocada com a quantidade de mensagens que recebeu do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro. Larissa faz parte do grupo de cerca de 145 mil pessoas que trabalharam no primeiro turno nas eleições municipais de 2024 do estado do Rio de Janeiro.
Não é a primeira vez que a estudante é convocada para a função. Nas eleições de 2022, Larissa também foi mesária e não teve uma boa experiência: “A galera vestida com blusa do Brasil já chegava de forma bem agressiva questionando os mesários sobre o processo eleitoral”. Apesar de a votação ter sido mais tranquila este ano, Larissa se disse frustrada por ter que voltar a prestar o serviço. E se prepara para trabalhar novamente dia 27, já que em sua cidade, Niterói, haverá segundo turno na disputa pela prefeitura. “Domingo, das 7h às 18h. Quem é a pessoa que quer perder o dia de descanso trabalhando? Sou estudante, estagiária e ainda estava trabalhando aos sábados na campanha de uma candidata. Domingo era para ser o meu dia de descanso”, reclama.
Larissa explica que tentou pedir dispensa do serviço por ter trabalhado em campanha, mas, como não estava em um cargo de coordenação, não conseguiu. Para conseguir a dispensa, é necessário fazer a solicitação em até cinco dias após a convocação e ter um motivo considerado “justo”, de acordo com o Código Eleitoral. O pedido pode ou não ser aceito pela Justiça Eleitoral, e o valor da multa para o mesário faltoso varia de meio a um salário mínimo.
De acordo com a Lei nº 9504/97, a Lei Eleitoral, atuar como mesário, embora não seja uma atividade remunerada, garante benefícios, entre eles, alguns dias de folga no trabalho. A quantidade de dias é determinada de acordo com as trabalhadas por cada mesário, já que cada um pode ter função diferente. Mas Larissa diz que não se sente confortável e segura para exigir seu benefício: “Que trabalhador de empresa privada tem coragem de pedir ao chefe seus dois dias de folga? Os dois dias em que eu tiraria folga poderiam afetar bastante a dinâmica da empresa”.
O engenheiro Alexandre Borges, 55 anos, compartilha o mesmo pensamento que Larissa. Em 2010, quando foi convocado para trabalhar como mesário, não tirou folga do trabalho na semana seguinte. “Eu trabalhava em uma multinacional e não podia me dar o luxo de tirar de folga. Tinham tarefas que dependiam de mim. Então, mesmo trabalhando sábado e domingo, já que fui presidente da seção e tive que receber a urna um dia antes da votação, na segunda-feira, voltei para a rotina normalmente”, conta Alexandre.
“Até pode ser ‘jogo’ para um funcionário público, mas para o funcionário de uma empresa privada, a situação já é mais complicada”, explica Larissa.
Nem todos os servidores públicos consideram interessante trabalhar nas eleições. A universitária e técnica administrativa da Uerj Caroline Fernandes, 25, nunca atuou como mesária e diz que mesmo com a possibilidade de tirar folga no trabalho não seria voluntária para o serviço. Caroline acredita que é um trabalho estressante, cansativo e de grande responsabilidade. A servidora não se sente sobrecarregada no trabalho, portanto, não procura por esses dias de folga.
Por outro lado, há mesários que se voluntariam para exercer a função porque querem contribuir com o processo democrático. A servidora pública do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Roberta Musa, 50, conta que, antes de ser aprovada no concurso público, ainda universitária, se ofereceu para o serviço. “Fui mesária durante dez anos. Eu gostava porque sempre fui muito comunicativa e era uma forma de encontrar meus amigos e conhecidos do bairro”, afirma. A servidora deixou de se voluntariar quando virou mãe e, atualmente, quem é convocado para trabalhar nas eleições é o seu filho, que, diferentemente dela, não gosta nem um pouco de ser mesário. Assim como Larissa, o filho de Roberta também foi convocado para exercer a função pelo segundo ano seguido.
Roberta considera injusto que sempre convoquem as mesmas pessoas e diz que o jovem ficou chateado ao ser convocado novamente. Em suas experiências enquanto mesária, Roberta conviveu com vários universitários que não demonstravam nenhum interesse em estar naquela situação. “Alguns passavam o dia dormindo na cadeira e outros iam almoçar e só voltavam perto do encerramento da votação. Mas, sinceramente, na minha visão, eles não faziam muita falta porque parecia que eles convocaram mais gente do que realmente precisavam”, conta. Alexandre também presenciou momentos semelhantes: “Uma das pessoas da sessão era um jovem universitário que virou a noite e chegou na hora completamente esgotado e sem condições de trabalhar. Uma menina, também universitária, passou o tempo todo de cara fechada e nem organizar a fila ela conseguia”, relembra o engenheiro.
Para Larissa, a convocação obrigatória para a função de mesário nas eleições é capaz de afastar o jovem do processo político. Contudo, de acordo com o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, essa não é uma realidade: “Embora tenha havido uma leve queda na participação de jovens nas eleições de 2024 em comparação a 2022, a Justiça Eleitoral fluminense não enfrenta resistência entre os estudantes universitários. Os jovens de 18 a 24 anos representaram 11,17% do total de mesários convocados para o 1º turno de 2024, totalizando 16.280. Em 2022, essa faixa etária correspondia a 15,81%, com 21.308 mesários.”.
Dados do Tribunal Superior Eleitoral mostram que o Estado do Rio de Janeiro tem 1 milhão de eleitores que são jovens com idades de 18 a 24 anos. Eles representam aproximadamente 7,6% do eleitorado fluminense.
Em uma tentativa de atrair mais jovens para o trabalho eleitoral, o TRE-RJ desenvolveu o Programa Mesário Universitário, que permite aos estudantes converter as horas de trabalho nas mesas eleitorais em horas complementares para a faculdade. A Uerj é uma das universidades que aderiram ao programa. Para computar o tempo de atividade extracurricular em seu currículo, é necessário que o estudante entre em contato com o departamento do seu curso. A quantidade de horas depende da função exercida por cada estudante enquanto mesário.
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