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  • Foto do escritorGabriel Segantini

Transtorno de burnout: a nova doença que já é velha conhecida dos jornalistas

Atualizado: 13 de abr.

Segundo o Ministério da Saúde, jornalismo é uma das áreas mais propensas à síndrome do esgotamento


Reprodução: Freepik

Uma pesquisa da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) com 457 profissionais revelou que as tarefas em excesso e as cobranças aumentaram 55% na pandemia da Covid-19, fazendo com que a jornada de trabalho e os casos de burnout crescessem de forma excepcional na categoria. Jovens profissionais foram os mais atingidos. Um outro levantamento, este realizado pela Federação Internacional de Jornalistas (FIJ), mostrou que, entre os 295 jornalistas brasileiros entrevistados, 177 relataram aumento da ansiedade e do estresse durante o exercício da profissão no mesmo período - o equivalente a 61,25%.


A síndrome do esgotamento profissional, mais conhecida como burnout, é um distúrbio emocional relacionado ao excesso de trabalho, que apresenta sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações desgastantes durante o dia-a-dia de trabalho. Em 2022 foi reconhecida oficialmente pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como doença ocupacional.


Entre os fatores que podem explicar a alta ocorrência de burnout entre jornalistas estão os prazos apertados, a cobrança, a rotina desregulada e a incessante necessidade de atualização de informações. Há também fatores conjunturais: o jornalismo é um mercado em transformação, abalado profundamente pela perda de postos no jornalismo impresso, pelo encolhimento das redações tradicionais, pela exigência de novas competências tecnológicas para o mercado digital e pela disputa de atenção com outros produtores de conteúdo.


Cloves Teodorico, que trabalha em assessoria de imprensa, diz que a alta quantidade de demandas e as longas jornadas de trabalho, sempre associadas a cobranças, pressão e responsabilidade, foram os motivos que o levaram a desenvolver burnout. Ele afirma que o jornalista é muito suscetível a desenvolver o transtorno por atuar numa dinâmica de trabalho de vigilância quase constante.


“Trabalhamos com informação, então o tempo todo estamos demandando do cérebro, seja com ações e reações, ou até mesmo a memória. Nos tempos de hoje, da alta tecnologia e das redes sociais, percebo que ficamos muito mais vulneráveis, porque são muitos estímulos a todo tempo”, diz o jornalista. Teodorico destaca o jornalismo factual, que cobre os acontecimentos diários e mais relevantes, como uma das áreas em que os profissionais estão mais expostos à doença. “A notícia não tem hora para acontecer. A qualquer momento a gente é acionado, procurado, cobrado ou demandado a fazer alguma coisa. Ou necessita atualizar um conteúdo e, até, estar presente em algum local de um fato. Enfim, é a nossa rotina, ficar à mercê do funcionamento do mundo das informações”, complementa.


De acordo com um levantamento realizado pelo portal britânico Journalism.co.uk, jornalistas recém-formados apresentam maior inclinação ao cansaço extremo no trabalho pelo fato de ainda precisarem se estabelecer profissionalmente, fazendo com que os sinais de possível esgotamento sejam ignorados.“Eu já estou em casa trabalhando, então vou trabalhar mais. Eu tô com tempo aqui, vou fazer mais um pouquinho de trabalho”, explica Helena Mayrink, de 28 anos, jornalista formada pela Uerj em 2020, sobre sua rotina de trabalho quase ininterrupta em home office durante a pandemia. Por sorte, ela conseguiu escapar da síndrome de exaustão mental. Mas lembra que não conseguia se distanciar do trabalho. “Eu tinha muito esse problema de, às vezes, sentir que estava trabalhando quase o tempo todo. Eu estava muito apegada ao trabalho também. E não tem a questão de voltar para casa, então, às vezes, a divisão entre o trabalho e a casa causava confusão”, conta Helena.




Dicas para evitar o burnout

Segundo Patrícia Simões, psicóloga especializada em Terapia Cognitivo Comportamental, entre os cuidados para conseguir minimizar os riscos da síndrome do esgotamento estão manter uma alimentação benéfica à saúde e uma rotina saudável de sono, dormindo no mínimo 8 horas por noite, participar da vida social e familiar e praticar atividades físicas constantemente. Além disso, é preciso buscar suporte de profissionais especializados na área do cuidado da saúde mental. Em muitos casos os indivíduos não são capazes, profissionalmente, de enxergar a situação da forma mais clara e acabam não respeitando os limites do próprio corpo e mente diante do excesso de competitividade no mercado.


Alguns países começam a alertar para a responsabilidade legal dos empregadores em casos de burnout. Na Austrália, por exemplo, novas legislações classificam o burnout como risco à segurança e à saúde do trabalho, fazendo com que os chefes sejam obrigados por lei a identificar e controlar danos que possam ocasionar estresse dentro do espaço trabalhista, seja alta carga de trabalho até longas jornadas laborais. Essas mudanças ajudam e protegem tanto jornalistas consolidados quanto a nova geração de profissionais.


Para Helena, que se graduou recentemente, o cenário tende a se alterar futuramente, porque, a nova geração de profissionais está mais sensibilizada e conversando mais sobre a questão da saúde mental, principalmente em relação ao trabalho. E os chefes estão entendendo melhor como lidar com a questão. A jornalista acha importante a troca de experiências entre os jornalistas sobre o assunto, porque pode ajudar a esclarecer o que de fato está acontecendo. “A lógica do trabalho de se jogar muito e empenhar muito pode acabar deixando as coisas meio nubladas, sem que se saiba diferenciar burnout de cansaço”, ressalta a profissional.


Cloves Teodorico, que sofreu com a síndrome de burnout, afirma que o transtorno, apesar de relacionado ao trabalho, mexe bastante com o lado individual, pois há um sentimento de vulnerabilidade, incapacidade e medo de reingressar no mercado de trabalho. Ele ressalta que o primeiro passo para conseguir melhorar e se tratar é a aceitação. “O primordial que fiz para melhorar da pior fase do burnout foi me cuidar, olhar para mim e aceitar que eu estava doente e que eu tinha que mudar meu comportamento em relação ao trabalho”, lembra.

Teodorico também destaca a importância de conseguir conciliar a profissão e a tentativa de se recuperar para evitar desenvolver o transtorno novamente. Estabelecer limites, escolher alternativas e oportunidades que demandam menos e se encarregar de menos atribuições são atitudes primordiais para criar uma nova rotina mais saudável física e mentalmente. “Hoje eu prefiro ter menos responsabilidades e ter mais tempo para mim. Conseguir ter um final de semana, ter folga; conseguir ‘ter uma vida normal’, que, na maioria das vezes, o jornalismo não propicia”, finaliza.


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